Na vida, a
obreira hereditariedade pode ser observada em cada semente plantada. Minha
existência é um cercado que não ouso atravessar. Ele é o meu limite, meu
semáforo vermelho. Lembro de minha avó, visão de olhar austero em sua dignidade
diante do fogão de lenha.
Essa lembrança
faz-se lume no caldeirão da alma, cozinhando em fogo brando as reminiscências da
infância perdida. Minhas matas são repletas de presenças reais e imaginárias.
Dos meus telhados, prazenteiras águas de chuva morna seguem pelas cumeeiras de
trilhas irregulares. Não posso negar. É uma vivência altaneira, cheia de flores
e cores, um cenário onírico escondido sobre arcos de pontes; uma magia rósea sob
um céu infinitamente azul.
Um
quintal grande e frondoso, de mangueiras, goiabeiras, amoreira, chão repleto de
folhas que eu adorava varrer. Um verdadeiro ninho que me acolhe ainda, na
imaginação. Ali, o vento não sopra com ira tecnológica. A amoreira, perto do
portão, me serve ainda como parque de diversões, como a janela da minha
criatividade, janela da minha infância que nunca fecho, vivenciando sempre os
momentos da vida com a alegria de uma eterna criança, nas mãos de Deus. Aprendi
a voar para o passado, mas sem me esquecer de que sempre preciso voltar, depois
desses voos incríveis...
A quietude e a
paz transparece nos semblantes de meus pais e meus irmãos - meninos. O vírus
megaurbano não chegou por lá. Minha mãe ama seu pequenos jardins, um de cada
lado da porta da frente, com a sutileza de cada flor. Meu pai ergue no céu uma
pipa e sentindo que está firme, entrega-a ao meu irmão mais velho. No irmão do
meio, um cheiro de insights, de vocações, sem metodização. Acha-se um gênio
incompreendido até por si mesmo.
Meu pai... seus
olhos sorridentes trazem consigo a sabedoria elevada à transcendência de uma
sensibilidade cativante, ao dirigir seus pedidos ao céu de braços erguidos e
olhos fechados.
Em torno da
roda família, uma hoste de espermatozóide em busca do óvulo, onde poucos
penetrarão. São galhos que surgem, vez por outra, na genealogia da vida,
enrijecendo a árvore matriz e florindo-a.
Meu irmão
semi-novo, depois de sete anos de aridez uterina, veio com um objetivo... sim,
porque ninguém está aqui por acaso. Ele é uma pequenina cópia da árvore
principal e a natureza joga sua própria versão nesse jogo. Da infinita
possibilidade de caminhos, ela escolhe uns poucos.
E o irmão mais
novo? Com ele vão chegando aos poucos novas informações, novos mundos para serem
explorados, constante expansão de vida, de consciência e memória, mas nem por
isso ele perde a ternura.
Aí... a gente
cai na real. Chegam nossos filhos. Com eles, a cibernética, hardware, software,
engenharia genética... porque a tecnologia é a mãe da civilização. Fora desses
caprichos tecnológicos situam-se as tendências da vida. A ciência é conjunto de
modelos fragmentados de realidade, embora existam muitos cientistas brincando de
serem deuses.
Aos modernos,
os mitos e as paisagens do passado parecem pueris... mas como são fundamentais
para os antigos, meu Deus! |